O processo de luto é uma coisa curiosa. Perante a morte, que todos sabemos existir, ficamos à toa. O que raio é suposto ser o luto? Ouvimos falar dele e é tão subjectivo, tão…estranho. Não há uma forma certa. Há a nossa forma, a possível, mais ou menos pacífica, mais ou menos intensa. Ninguém nos prepara para a morte. Ninguém quer falar dela, como se isso a atraísse para perto, Valha-nos Deus! Caramba! E depois,somos apanhados na curva. E fazemos o quê? O que é possível. Nenhuma perda é igual, não somos os mesmos depois de cada perda. Esta perda não foi a primeira. Mas é a primeira vez que sinto em cada célula do meu corpo essa coisa do luto. Tem, para mim, um sabor agridoce. Em parte, há uma paz cá dentro. Não ficou nada por dizer, por fazer, por amar. Por outro, ficou tudo em suspenso. Aquele passeio à beira-mar, pela fresquinha, assim que o tempo ficasse menos quente e o corpo já aguentasse. Assim que, assim que…assim que se foi.
Dou por mim a pensar “ninguém entende esta coisa” como se eu fosse a única que perdeu alguém precioso. Sou a neta. Uma das netas. Somos três. Quatro bisnetos que orgulhosamente a conheceram. Há duas filhas, gémeas, que deram tudo, tudo, tudo e mais ainda até ao fim. Há genros, sobrinhos, irmãos, cunhadas. Há vizinhos. Há uma série de gente que privou com a D. Madalena… com a bonita e elegante e cheirosa D. Madalena. A sofrida D. Madalena. A minha.
Lembro-me dela todos os dias. Do cheiro da pele a rosas, das curvas dos dedinhos das mãos e dos pés. Do cabelinho branco, tão bonito! Os meus filhos lembram-se das piadas e dos chapéus, e assim, memória a memória, ela está sempre aqui connosco.
Sinto-me egoísta por falar assim da minha avó, como se só eu sentisse coisas, algumas que não tenho falado com ninguém… Quero homenagear cada uma das pessoas que passa por lutos, alguns para a vida toda e dizer “Estamos juntos”. O caminho vai sendo feito de momentos de alegria e tristeza, de memórias vivas e outras um pouco distantes, mas é feito corajosamente, por trás do sorriso, do quotidiano, do trabalho, da azáfama da vida. Custa, às vezes alivia, às vezes aperta, às vezes é vazio… Falemos da morte, então. Celebremos a vida, para que quando a nossa passagem chegar, tenhamos o coração cheio de amor e não de mágoas ou coisa por dizer ou fazer. O momento é este, é o agora.